
Mas mesmo que a máquina funcionasse bem, não pensem que é fácil julgar… ora, atentem a este extracto da famigerada obra de Miguel Cervantes, “D. Quixote de La Mancha”.
(…)
- Senhor: um rio caudaloso dividia dois campos de um mesmo senhorio (atenda-me Vossa Mercê, porque o caso é de importância e bastante dificultoso). Nesse rio havia uma ponte, ao cabo da qual ficava uma porta e uma espécie de tribunal em que estavam habitualmente quatro juízes que julgavam segundo a lei imposta pelo dono do rio, da ponte e das terras, que era da seguinte forma: se alguém passar por esta ponte, de uma parte para a outra, há-de dizer primeiro, debaixo de juramento, onde é que vai; e, se jurar a verdade, deixam-no passar, e, se disser mentira, morra por elo de morte natural, na forca que ali se ostenta, sem remissão alguma. Sabida esta lei, e a sua rigorosa condição, passaram muitos, e logo, no que juravam, se mostrava que diziam a verdade, e os juízes, então, deixavam-nos passar livremente. Sucedeu, pois, que, tomando juramento a um homem, este jurou, e disse que fazia este juramento só para morrer na forca que ali estava e não para outra coisa. Repontaram os juízes com o caso, e disseram: Se deixamos passar este homem livremente, ele mentiu no seu juramento, e, portanto, deve morrer; e, se o enforcamos, ele jurou que ia morrer naquela forca, e, tendo jurado a verdade, pela mesma lei deve ficar livre. Pergunta-se a Vossa Mercê, Senhor Governador: Que hão-de fazer os juízes a este homem, acerca do qual estão ainda até agora duvidosos e suspensos? (…)
Podem lavrar os vossos palpites…