
No Alto Douro, o tempo ainda é o que era. A natureza, por aqui, ainda continua a ser rainha. Deixou-se maquilhar mas não se deixou dominar. Nem mesmo a construção de grandes barragens hidroeléctricas (o Douro produz mais de 50% da energia hidroeléctrica do país) e da auto-estrada (A24) que o atravessa na perpendicular, foram suficientes para lhe alterar (de todo) o curso e os ciclos naturais da vida.
Aqui, não vale a pena encomendar as coisas para ontem… porque serão sempre para amanhã. Aqui, a natureza não se deixa enganar, a monotonia dos dias é esmagada pelo pulular constante da vida que se manifesta nas asas de uma andorinha ou de um estorninho que partem pelo Outono mas teimam em chegar sempre que é Primavera. E esse vai e vem não deixa poiso para rotinas porque os trabalhos, tal como a vida, todos os dias se renovam. Cada dia é um dia, todos têm nome e identidade. Embora parecendo iguais, todos exigem tratamento diferente e diferenciado. Quem colhe as uvas num dia, no outro, os bagos lhe há-de pisar e, noutro ainda, pelas veias lhe há-de correr o doce néctar que antes de subir à mesa dos reis lhe tonificarão forças para as mil tarefas que há-de abraçar antes de nova colheita se anunciar.
Os ancestrais “nove meses de Inverno e três de inferno”, numa alusão aos rigores dos Invernos durienses e ao caldeirão em que ele se transforma durante os meses de estio, ainda são a imagem de marca, destas bandas, quando o termómetro é o instrumento de aferição.
No entanto, aos olhos do comum mortal, o Douro, é provavelmente, a região do país onde as quatro estações do ano se fazem mais notar ao deslumbramento dos olhos que têm o privilégio do o contemplar. Na Primavera, é o despontar das amendoeiras e das cerejeiras que lhe dão o tom colorido e gracioso de um novo despertar. No Verão, é o verde imenso das videiras a talhar e a rendilhar os vales profundos e os socalcos alcandorados até ao céu. O Outono chega com a sua paleta de cores quentes – amarelos, castanhos, vermelhos… – que numa mescla de policromia intensa se combina em miríades de tons que nos enche de encantamento o olhar. Finalmente, o Inverno, puro e rude, intensamente despojado, onde apenas sobressai o casario que aqui e além teimam em dizer que ali há vida e que há homens e mulheres que lhe fazem companhia e que acreditam num novo despertar… que acreditam que a Primavera logo vem. E que, em vindo, logo o Verão se faz anunciar. Foi o que acabou de me segredar a primeira cereja que colhi no meu jardim…